“A corte dos Médicis era conhecida por grandes banquetes teatrais”
A aristocrata italiana levou refinamento à cozinha francesa. |
Na linha do tempo que conta a história da gastronomia há um capítulo especial dedicado à nobre italiana Catarina de Médici (1519-1589). Foram pouquíssimas as figuras femininas que se tornaram célebres nesse universo tradicionalmente dominado por homens. Catarina foi uma das exceções. Nascida em Florença, berço do Renascimento, ela viveu num cenário de mudanças, tanto nas artes e na ciência como também nos hábitos levados à mesa. Nesse período, que vai do século XIV e tem seu auge no século XVI, saem os banquetes medievais e entra em cena uma Itália que se tornou símbolo de refinamento.
O uso do garfo, as peças esculpidas em metais de boa qualidade, os aparelhos de jantar, as toalhas bordadas e as porcelanas transformaram e sofisticaram o comportamento à mesa. É claro que estamos falando de um mundo particular, do qual apenas duques, condes e outros nobres faziam parte. Filha de banqueiro, Catarina bebia dessa fonte.
“A corte dos Médicis era conhecida por grandes banquetes teatrais”, descreve Roy Strong em seu livroBanquete: Uma História Ilustrada da Culinária, dos Costumes e da Fartura à Mesa (Editora Jorge Zahar, 2004). Strong conta que a refeição do Renascimento italiano tinha, entre outras coisas, hortaliças e uma mesa lateral em que se expunham e serviam pratos frios. Havia preferência pelas carnes brancas, como vitela e caça, indicadoras de status.
Da Itália para a França
É curioso notar que a gastronomia francesa, referência quando o assunto é a cozinha clássica, só começou mesmo a deslanchar quando Catarina de Médici se casou, em 1553, com o futuro rei francês Henrique II. Ela tinha apenas 14 anos na época. Ao mudar-se para Paris, a aristocrata florentina arrastou consigo um séquito de serviçais, amas e, claro, cozinheiros e confeiteiros. Na mala, carregou pratarias, porcelanas, louças e ainda alcachofras, trufas, cogumelos. Mas, sobretudo, a noção de refinamento à mesa.
“Catarina trouxe seus hábitos e passou a ser observada pelas cortes francesas”, explica Wanessa Asfora, professora de história da gastronomia do Senac-SP. Embora esse seu novo comportamento possa ter causado estranheza no início, aos poucos passou a ser imitado. “Naquele momento, a Itália estava associada à sabedoria renascentista, era oficialmente mais herdeira do passado clássico e, por isso, acabava exercendo certo fascínio sobre os franceses”, deduz Wanessa.
Catarina serviu de inspiração: do elementar (mas até então desprezado) hábito de lavar as mãos antes das refeições, ao uso de louças e talheres decorados e até da escolha do ambiente e da música mais adequados para o ritual à mesa.
De prato em prato
Consta dos livros que não faltava apetite à rechonchuda Catarina. Ela não se intimidava nos banquetes, era chegada em ensopados e tinha profundo apreço pelos doces que, graças a ela e seus confeiteiros, passaram a ser preparados com açúcar na França – onde, até então, eram feitos apenas de mel. Abaixo, veja algumas sobremesas que ganharam fama na cozinha francesa pelas mãos de uma nobre e gulosa italiana.
- macarron: o biscoitinho de farinha de amêndoa nasceu ‘maccherone’ no século XVI. Levado para Paris por Catarina, mais tarde ganhou recheio e assumiu a forma irresistível da guloseima tal qual a conhecemos hoje.
- sorvete: o italiano Marco Polo trouxe a receita em uma de suas viagens à China, mas ela não teria saído da Itália até meados do século XVI, quando um dos cozinheiros de Catarina introduziu a sobremesa gelada na corte francesa.
- bolos decorados: no casamento de Catarina com Henrique II, um bolo criativo, feito em andares, impressionou os convidados. A partir daí, bolos incrementados assim passaram a ser sinônimo de status.
- profiterole: hoje muito popular na França, foi considerada uma iguaria real no século XVI. Reza a lenda que o docinho também fez parte do receituário dos cozinheiros de Catarina.
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